• Marco Ferrari Sommelier
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O Vinho em Roma Antiga - 1ª parte
  • O Vinho em Roma Antiga - 1ª parte
    O Vinho em Roma Antiga - 1ª parte

  • O Vinho em Roma Antiga

    Antes de falar sobre o vinho e sua influencia sobre a cultura romana, precisamos entrar um pouco na ordem de ideias do cidadão de Roma e do contexto cultural, estou falando da Roma dos Césares, quem já a visitou, embora hoje seja visível a ação do tempo, pode imaginar o que era há mais de dois mil anos atrás, uma cidade com milhares de habitantes?

    Com edifícios da altura de prédios modernos?

    Ruas, praças e estradas pavimentadas?

    Com um eficiente sistema de aquedutos e esgoto, isso para falar apenas do que saltava aos olhos, parafraseando Otaviano Augusto, primeiro Imperador de Roma que governou de 27 a.C. até o ano 14 de nossa era...” Encontrei uma Roma de tijolos e deixo-a de mármore”.

    Mas não podemos esquecer que Roma produziu uma sociedade organizada no aspecto econômico, social e militar que permitiu dominar, cultural e militarmente, a Europa durante treze séculos, do século VIII a.C. até o ano de 476 quando o último imperador Romulo Augusto foi destituído por Odoacro, rei dos bárbaros Germânicos, uma dominação que redimensiona, e muito, a atual supremacia americana.

    Na prática Roma era, na época, o suprassumo da cultura ocidental, a expressão máxima da civilização, em termos de hábitos e de convívio social.

    Não vamos aqui se perder nas várias mazelas, na corrupção que imperava, no regime de escravidão que ainda vigorava e nem nas perseguições aos dissidentes de sua religião, não vem ao caso.

    Vamos sim focar no cidadão romano, um cidadão que, pela lei, estava acima dos provincianos, os camponeses do interior, importantes para prover o alimento para Cidade Eterna, mas não tanto para ditar seu destino e nem para serem representados no Senado ou nas Tribunas.

    E que dizer dos povos Celtas da Gália? Das terras Germânicas e além, raças inferiores de costumes bárbaros que apenas precisavam ser vigiados pelas legiões para que não representassem perigo ao sossego da Capital.

    Em suma o romano se considerava um cidadão de classe superior, por isso tinha hábitos diferenciados, o romano, a diferença dos bárbaros, não ingeria cerveja, bebida considerada de cunho inferior, produzida a partir de cereais, coisa de bárbaro, justamente.

    A bebida do romano era o vinho, bebida civilizada e de grande valor.

    O romano consumia vinho, nas festas, no dia a dia, como alimento, como fonte de inspiração para a poesia, para o lazer e para matar a sede quando ia ao campo passear.

    Além disso o vinho era utilizado para selar acordos comerciais, para homenagear os mortos nos ofícios fúnebres, além de servir como remédio, ou melhor, ingerido junto aos remédios receitados por aquela farmacologia arcaica, ajudava a mitigar o gosto terrível.

    Os romanos eram também democráticos quanto ao uso do vinho, muito mais do que as civilizações que antes deles o produziam e consumiam, os romanos foram os únicos a permitir e incentivar seu consumo junto à totalidade de seu povo, não somente os patrícios e os nobres  podiam beber vinho, também plebeus, pobres e até escravos consumiam a bebida sem problema, mantidas as devidas diferenças de qualidade entre o vinho de uns e o vinho dos outros.  

    Foi naqueles tempos que a dieta mediterrânea surgiu, vinho pão e azeite formavam a sólida base alimentar sobre a qual os povos do Mediterrâneo construíram seu sustento.

    Como logica consequência desse habito , em decorrência da expansão do império e de suas conquistas, a necessidade de prover as legiões cada vez mais distantes de sua terra, impelia a expansão obvia da viticultura, os legionários não podiam enfrentar marchas em terras hostis, confiando apenas na água que encontrassem no caminho, a mesma podia ser insalubre ou pior, podia ter sido envenenada pelos bárbaros.

    Por esse motivo é que os romanos foram os verdadeiros responsáveis pela expansão da viticultura nas terras europeias, da França, Espanha e Portugal.

    Os povos dessas terras já conheciam o vinho, certamente, os mercadores Fenícios em suas viagens pelos mares desde o século X a.C. (Roma só seria fundada em 21 de abril de 753 a.C. e por mais de dois séculos não passaria de um vilarejo grande) já tinham se encarregado de levar vinho para trocar por mercadorias, mas nem os Iberos, nem os Celtas tinham noções de viticultura, trocavam seus produtos e seus escravos por jarros de vinhos da Grécia, do Líbano , da Mesopotâmia ou do Egito, faziam festas, bebiam e, uma vez que acabava, voltavam às cervejas.

    Os romanos, precisavam aproximar a produção do vinho às províncias e legiões, porém o transporte naquela época só era viável por água, mar ou rio que fosse, até porque um jarro de vinho pesava mais que o próprio vinho, as estradas eram perigosas e esburacadas e a imane fadiga dos animais impossibilitava cobrir longos trajetos por via rodoviária.

    A solução encontrada foi o plantio da videira em regiões que apresentassem aptidões para a viticultura, nisso a Gália saiu na vantagem, já apresentava um precedente.

    Por volta de ano de 600 a.C. os gregos fundaram Massália, uma Polis (antigas Cidade – Estado da Grécia, tinham governo independente mas, em caso de perigo, tinham obrigações militares com a metrópole) na costa mediterrânea da Gália e plantaram alguns vinhedos experimentais ao redor da cidade, os romanos se valiam da amizade da Polis durante as lutas contra os Cartagineses e os Celtas do interior e chegaram a conhecer bem a cidade e seus arredores.

    Inspirados no sucesso daqueles vinhedos, criaram coragem para replicar a viticultura experimental nas outras áreas mediterrâneas, incluindo aí Espanha e Portugal ao Oeste e, à medida que iam derrotando os Celtas prosseguindo em sua dominação rumo ao interior, avançavam nas conquistas de terras e plantavam vinhedos.

    Assim se deu a colonização da Gália Transalpina, séculos antes de ser chamada de França, pelos Romanos, uma colonização militar, social e vitivinícola.

    Mas voltando a viticultura de Roma e suas origens, foram variadas as influências no começo, na Itália todo mundo fazia vinho podemos dizer, ao sul de Roma eram as Polis da Magna Grécia e ao norte eram os Etruscos que dominavam as belas colinas da Toscana e olhavam cada vez mais desconfiados por aquela cidade que nasceu vilarejo miserável, em pouco tempo cresceu de tamanho e já estava dando fortes sinais de expansão, mas essa é uma história que vou deixar para depois...