• Marco Ferrari Sommelier
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Valtellina - O Vale Esquecido
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    Valtellina - O Vale Esquecido

  • Valtellina. O Vale Esquecido

    ATT...Texto com conceitos técnicos avançados... abstenham-se os apressados...

    A Valtellina é uma região vinícola muito peculiar, a altitude e a latitude chamam a atenção, mas o diferencial mesmo é a situação geográfica que a natureza nos apresenta.

    Vale Alpino ao Norte de Milão, com vinhedos trepados nas encostas íngremes das montanhas italianas, a pouca distância da Suíça, traduz como poucos o conceito de Viticultura Heróica.

    Na Valtellina o varietal dominante é aquele mesmo Nebbiolo, aqui denominado Chiavennasca, que cerca de 300 Km mais ao sul, no Piemonte, protagoniza dois dos mais importantes tintos italianos, Barolo e Barbaresco. Acabam por aqui as similitudes, a majestade do Barolo, Rei dos Vinhos e Vinho dos Reis, contrasta com a resiliência camponesa do Nebbiolo da Valtellina, com a teimosia e a persistência única de quem já não possui alternativas a não ser fazer da limitação uma virtude, para disputar um espaço no concorrido cenário enológico da Itália.

    O Nebbiolo da Valtellina, doravante denominado Chiavennasca, estende seus domínios ao longo de um vale que acompanha o correr sinuoso do rio Adda, num peculiar movimento transversal, de Oeste para Leste, quando os demais torrentes com nascente alpina, desdobram-se no obvio sentido Norte - Sul.

    Mas aqui de obvio nada temos, pois se de obvio se tratasse, certamente já havia quem o fizesse, e muito bem. Então cabe ao nosso resistir, crescer, produzir, enfim, teimar em não desaparecer. Num ambiente em que tudo é desafio, do cultivo em área tão impérvia de ser apelidada de heróica, ao solo pobre, árido e inóspíto, que depende da generosidade da chuva para oferecer as condições mínimas de sobrevivência.

    Mas nem tudo é castigo, a orientação inusual desse vale forma uma proteção natural, dada pelas encostas rochosas que se esgueiram atrás dos vinhedos, tal que os ventos do norte não açoitem as videiras em sua fase mais delicada, o olhar voltado para as leves brisas que do Lago de Como sobem o vale e as encostas rochosas que armazenam e distribuem o calor dos raios solares do verão, formam um conjunto de fatores que permitem a viticultura e exaltam a qualidade da Chiavennasca.

    Particularmente interessante é a influencia do sol nos vinhedos da Valtellina, comprovei por experiência pessoal.

    Estava no fim de uma manhã de primavera, com tempo fechado, chuvoso e preguiçoso a esticar o meio dia, quando, no espaço de menos de meia hora, o sol resolveu dissolver as nuvens pesadas e dar o ar da graça em pleno Cru Inferno. Por incrível que possa parecer, no decorrer de cinco minutos, a temperatura subiu de tal maneira que precisei me livrar da jaqueta invernal, do até então indispensável cachecol e do casaco de lã, para arquejar em mangas de camisas num calor que não ficou a desejar a quem já se acostumou às tempeaturas cearenses.

    Como já falado, a casta principal é a Chiavennasca, vinificada em varietal ou em presença de outras tintas autóctones, ou internacionais, sobretudo Merlot e Pinot Noir, em proporção nunca superior a 10%; na verdade a tendencia é que nos vinhos de alta gama a Chiavennasca domine sozinha, nobreza para tanto não lhe falta.

    Ao longo do vale alguns vinhedos ganham destaque pela qualidade de suas uvas, os Cru Sassella, Grumello, Inferno, Maroggia e Valgella fornecem a matéria prima para os melhores vinhos da Valtellina.

    SFORZATO DI VALTELLINA DOCG

    Esse vinho é considerado o de maior prestigio da região. O Sforzato, ou Sfursat como é chamado no dialeto regional, é um vinho produzido a partir de uvas parcialmente passificadas, vinificadas após um período de parcial passificação em esteiras denominadas FRUTTAI de cerca de quatro meses, durante o qual perderam cerca de 40% de seu peso em água, após esse periodo e sua consequente vinificação, o vinho é submetido a vinte meses de afinamento entre madeira (mínimo 12 meses) e garrafeira.

    Trata-se de um vinho seco, de elevado teor alcóolico, acima de 14%, de cor típica grená, com aroma complexos de frutas pretas maduras, especiarías, flores murchas e madeira, em boca se apesenta enxuto e macio, o elevado teor alcóolico torna esse vinho extremamente aveludado e agradável. Vinho de guarda.

    VALTELLINA SUPERIORE DOCG

    Em minha opinião, de acordo com meu gosto pessoal, é o melhor tinto da região, sua estrutura permite longos envelhecimentos, afinal o DNA do Nebbiolo é assim mesmo. A cor varia de um rubi profundo a um grená alaranjado com o passar do tempo. A versão Riserva certamente é a mais empolgante, em vez da potência e do tanino marcante dos Nebbiolo do sul, o Valtellina se apresenta muito elegante, estrutura fina e enxuta, sobre um nariz rico e empolgante de couro, frutas maduras, violeta e especiarias, muito longo e tenso. Um vinho da mais alta linhagem.

    O Valtellina Superiore precisa de 24 meses de envelhecimento para ostentar a DOCG no rótulo, já o Riserva necessita aumentar para 36 os meses de afinamento, entre madeira e garrafaeira, para ser comercializado.

    OS CRUS DA VALTELLINA.

    Para além dessas duas menções acima, o Valtellina Superiore pode ostentar no rótulo a referência ao vinhedo de origem, desde que suas uvas tenham sido colhida num dos vinhedos, CRU, autorizados da região.

    INFERNO, o menor, o mais desafiador e íngreme de todos os Cru da Valtellina, seu nome faz referência às condições inóspitas e fascinantes ao mesmo tempo, de seu território. Os vinhos são estruturados, austeros quando jovens, tânicos e muito longevos.

    GRUMELLO, leva o nome do homónimo castelo que domina o vale, excelente nariz, típico da Chiavennasca, o Grumello se apresenta com taninos potentes e importantes, porém um pouco mais macios e redondos quando comparado ao Inferno; envelhece muito bem.

    SASSELLA, talvez o mais conhecido da Valtellina, muito presente nos mercados internacionais, o Sassella é menos impactante que Inferno e Grumello, a fruta se faz mais presente e a estrutura tánica, embora marcante, é mais aveludada e plena. Sabe envelhecer com maestria.

    VALGELLA, é o maior Cru da Valtellina, preferido pelos consumidores suíços que monopolizam sua comercialização, o Valgella é o mais macio e aveludados dos Cru, por esse motivo é aquele que melhor se apresenta quando jovem, floral, de taninos maduros, pode envelhecer bem como todos os Valtellina ou ser consumido quando jovem.   

    MAROGGIA, a mais recente e menor subzona da Valtellina, sua produção é muito limitada, poucas garrafas, porém de alta qualidade, aveludado e com taninos presentes.

    Outros vinhos também são produzidos na Valtellina, porém, devido ao caráter desafiador da viticultura nessa região, todos os produtores preferem focar nos vinhos de alta gama, deixando para os mais simples as uvas que não alcançam os requisitos exigentes dessa denominação gloriosa.

    VALTELLINA ROSSO DOC ou ROSSO DI VALTELLINA DOC, representam os vinhos mais simples da região, em cuja produção se utilizam as uvas de vinhedos mais jovens e de localização menos favorecida, assim de oferecer um vinho jovem, frutado e ideal paras o consumo diário.